Bolívia O que representa a fundação do novo PT?
06 de fevereiro de 2013
Bolívia
O que representa a fundação do novo PT?
O ascenso das massas trabalhadoras na América Latina e a tentativa da burocracia sindical de canaliza-lo no próprio benefício
A COB (Central Operária Boliviana) anunciou a criação do IPT (Instrumento Político dos Trabalhadores) numa conferência, denominada “Primeira Conferência Político-Sindical dos Trabalhadores da Bolívia”, realizada na cidade de Cochabamba, localizada a 400 km ao sudeste de La Paz, nos dias 17 e 18 de janeiro, como uma "alternativa dos trabalhadores para a concretização dos objetivos da COB". O secretário executivo da central, Juan Carlos Trujillo, ainda destacou os "erros" e a "má gestão" do governo liderado pelo presidente Evo Morales. Foram aprovados os documentos que deverão ser aprovados no congresso fundacional oficial marcado para o dia 21 de fevereiro. A declaração de princípios, o programa de governo e os estatutos do partido tomaram como base os documentos apresentados pela Comissão Política da COB.
Os principais organizadores da Conferência foram a federação minera (FSTMB) e a Universidade Operária do Século XX. Além de Juan Carlos Trujillo, participaram Jaime Solares (membro do Conselho Executivo Nacional da COB), dirigentes e militantes das Centrais Operárias Departamentais de Cochabamba, Oruro, Tarija, La Paz e Santa Cruz, das confederações e federações de fábricas, dos professores, dos profissionais da saúde e de outros setores.
O IPT está nascendo a partir dos sindicatos. A COB, fundada ao calor da revolução de 1952, sob a liderança do histórico líder Juan Lechin Oquendo, reúne os principais sindicatos de trabalhadores do país. Em 1970, chegou a fazer parte da Assembleia do Povo, que apoiou o general populista Juan José Torres. Inicialmente, apoiou abertamente o governo do presidente Morales, mas acuada pelo ascenso dos trabalhadores em luta contra os ataques promovidos pelo governo nacionalista, a burocracia sindical se distanciou do apoio formal.
O avanço das tendências pela construção de um partido operário
Um dos principais focos do ascenso do movimento operário na Bolívia acontece região mineira de Huanuni, que conta com grandes tradições de luta. Ocupou um lugar de vanguarda na revolução de 1952. Entre 1969 e 1971, protagonizou as marchas de ocupação de La Paz em 1985. Na década de 1980, foi a única mina do Combol a não ser fechada. Foi finalmente privatizada em 1999, mas nacionalizada novamente em 2002. No levantamento popular de outubro de 2003, durante as chamadas “guerra da água” e “guerra do gás”, os mineiros de Huanuni foram em massa a La Paz, enfrentaram o Exército e provocaram a queda do presidente neoliberal Sánchez de Losada que levou ao governo de Evo Morales. Em outubro de 2006, 800 trabalhadores assalariados enfrentaram os cooperativistas da região que, impulsionados pelo Ministro de Minas de Evo e as multinacionais inglesas, tentaram se apoderar das melhores jazidas. Após a resistência ter deixado um saldo de mais de 10 trabalhadores mortos, 4.000 cooperativistas pobres foram incorporados como assalariados da estatal Mineira Huanuni.
Os mineiros de Huanuni, que hoje conta com 5.000 trabalhadores, foram determinantes na derrota da burocracia sindical nas eleições da direção da Central Operária do Departamento de Oruro no mês de novembro do ano passado, que, apesar de tratar-se de ter um caráter centrista, é a favor do IPT e contrária ao MAS. O programa da nova diretoria reivindica “os Documentos do XXXI Congresso Mineiro e do XV Congresso da COB nos que se planteia a necessidade de organizar o instrumento político dos trabalhadores. Por meio deste instrumento lograr uma representação operária no Parlamento para converte-lo, como indicam as Teses de Pulacayo, em tribuna revolucionária”.
Em Colquiri, a Central Operária Departamental é dirigida por Severino Estallani, um dirigente mineiro e opositor ao MAS e também favorável à construção do IPT "pela base"). Em La Paz, a Central Operária Departamental é opositora a Trujillo). Medidas similares foram adotadas pelos trabalhadores da Caixa Nacional da Saúde, no Departamento de Oruro, os trabalhadores da CNS em Oruro, pelo Sindicato dos Trabalhadores da Universidade Técnica de Oruro, e setores dos professores rurais e dos Aeroportos.
Os trabalhadores têm aprovado em assembleias a colheita de fundos adicionais para suportar a criação e manutenção do IPT, o que revela o ascenso do movimento dos trabalhadores na direção da fundação de um partido político independente do nacionalismo burguês.
Qual é o significado da fundação do IPT?
As tendências pela fundação de um partido dos trabalhadores se acentuaram devido ao aprofundamento da crise capitalista que provocou o aumento da crise do regime burguês de conjunto. O governo nacionalista viu reduzir-se a capacidade de manter o colchão social estruturado com a finalidade de conter o avanço das massas e, principalmente a organização independente.
Em 2010, maciços protestos das massas trabalhadoras obrigaram o governo Evo Morales a voltar atrás na aprovação da reforma do Código do Trabalho. A burocracia desempenhou um papel de contenção fundamental contra o “gasolinaço”, quando o governo decretou um grande aumento nos preços dos combustíveis em dezembro de 2011, que detonou enormes protestos. No ano passado, atuou da mesma maneira contra a luta dos trabalhadores da saúde, que protagonizaram a greve mais longa da última década, e da educação, na luta dos mineiros de Colquiri, que encabeçados por Severino Estallani conseguiram a nacionalização de 100% da mina, e no paro de três dias, impulsionado sob a pressão dos trabalhadores pelo aumento do salário mínimo. A direção da COB rompeu a unidade na luta com os indígenas mojeños (yuracares) e chimanes contra o plano do governo de atravessar o Parque Isiboro-Secure – Tipnis com uma rodovia, que foram duramente reprimidos pelo governo; por trás, devido aos benefícios esperados pelo aumento dos negócios do setor mineiro na região. A questão do Tipnis provocou a ruptura de duas das cinco federações camponesas com o MAS.
As tendências na direção à criação do “partido da COB” se tornaram particularmente fortes após a queda da direção da COB, liderada por Pedro Montes, fortemente desgastada pela subordinação ao governo de Evo Morales, no XV Congresso da COB, realizado há um ano, no contexto do ascenso das lutas populares e do forte desgaste do governo nacionalista.
A fundação do IPT expressa, em primeiro lugar, o ascenso do movimento dos trabalhadores na América Latina que avança contra as várias alas do regime burguês, incluindo os setores nacionalistas. Por outro lado, a burocracia sindical está tentando se adiantar a essa tendência com o objetivo de direciona-la para seu próprio controle. Na reunião cume da COB, realizada nos dias 14 e 15 de maio, a burocracia sindical surfou a onda do IPT (Intrumento Político dos Trabalhadores), impulsionando uma comissão para a fundação, enquanto tirava o apoio aos indígenas de Tipnis e não cumpria a paralisação convocada por 72 horas.
Por um partido operário revolucionário e independente da burguesia
A saída para os trabalhadores bolivianos está na organização independente de todos os setores da burguesia, incluindo os setores da esquerda nacionalista, pela construção de um verdadeiro partido operário revolucionário de massas, sob a base dos sindicatos e contra a burocracia sindical, da COB em primeiro lugar. Neste momento, essa luta deve ser impulsionada de maneira independente dentro do IPT, dando continuidade à luta dos trabalhadores contra o Decreto 1126, a Lei Financeira e a defesa do Tipnis. As “nacionalizações” devem ser reivindicadas sob a base da expropriação dos setores vitais da economia sob o controle operário, a começar pelos bancos e os setores da mineração e hidrocarbonetos. A luta contra o burguesia nacional e o imperialismo passa pelo rompimento com os organismos controlados por eles, como o FMI, a OMC, o BM e o Mercosul, e a luta pelos Estados Unidos Socialistas da América Latina.
O IPT não é um partido operário revolucionário com possibilidades de derrubar o regime burguês. Ele tende a se configurar como um partido centrista. Mas a continuidade do ascenso da luta das massas, insuflada pelo aprofundamento da crise capitalista deverá colocar à ordem do dia o avanço dos revolucionários a luta contra os setores burocráticos no interior do IPT.
O exemplo do desenvolvimento da situação na Bolívia mostra que a tendência à organização política pelos trabalhadores avança na América Latina. No Brasil, essa tendência atingiu um ponto alto durante a década de 1980 e levou à formação da CUT após as oposições sindicais terem tomado a direção de mais 1.500 sindicatos impulsionados pela escalada da inflação. O ascenso foi contido pelos planos Cruzado e as políticas neoliberais viabilizadas pelas mercadorias de baixo custo produzidas pelos operários, principalmente, chineses submetidos a condições de semiescravidão. No próximo período, esse processo deverá ser retomado colocando em primeiro plano o inevitável confronto das massas trabalhadoras com a burguesia e o imperialismo.
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